Domingo, 30 de Janeiro de 2005

Asas


as asas que tenho
são as palavras que digo

com elas voo
com elas corro

as asas que tenho
são os silêncios ocultos
que procuro nos sentidos

com eles me deito
e com eles durmo até que me levanto



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 03:24
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Sexta-feira, 28 de Janeiro de 2005

Celebrarei

Celebrarei todas as virtudes
até que o tempo me diga se a erosão do sagrado
tem a dimensão dos segredos que vão caindo

Celebrarei todas as virtudes
as profanas e as conventuais
as dos outros e também as minhas

Até que a minha liberdade se cale
Celebrarei todas as virtudes



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 12:10
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Quarta-feira, 26 de Janeiro de 2005

A minha rua

A minha rua é de pedra muito bruta
paralelepípedos
paralelepípedos
paralelepípedos

A minha rua é a descer
mas quando chove a água não escorre
faz poças
faz poças
faz poças paralelepipédicas
nos intervalos dos paralelepípedos

A minha rua é geometricamente rectangular
Se fosse quadrada ou redonda
não seria uma rua mas talvez uma praça
E quando chovesse ao invés de
poças
poças
poças paralelepipédicas
eu na minha praça teria um lago
um lago
um lago provavelmente cubico
um lago provavelmente cilíndrico

A minha rua matematicamente é uma série... de buracos
religiosamente não anda nada católica
filosoficamente é uma mistura ecléctica... de fios eléctricos
politicamente é direita... mas desconfio que é vesga
enfim... é uma doida de uma rua



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 00:57
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Perfume

deixem as janelas abertas
para que possam entrar os aromas
e os ares sadios
que saem de casa convosco
bem cedo pela manhã

e à tarde fechem-nas
para que o vosso riso travesso
não caia sobre quem o não merece
e para que o vosso perfume esteja comigo

sempre ao meu redor

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 00:23
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Domingo, 23 de Janeiro de 2005

A inocência da luz

os peixes iludem os pescadores
as crianças zelam pelos adultos
e a inocência branca da luz é tanta

no paraíso


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 20:08
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Sexta-feira, 21 de Janeiro de 2005

Sigo o rasto

deixo as impaciências com os sapatos
a um canto
e sigo o rasto dos perfumes

percorro com os olhos
eflúvios que entardecem comigo
mas que não vejo

quero
mas não consigo domesticar as horas
nem os caminhos
e assim abalo tão descalço de tudo
nú como nasci

quero afastar-me quero

mas só me afasto tanto
quanto alguém se pode afastar
do que não tem fim

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 00:46
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Quarta-feira, 19 de Janeiro de 2005

Apascento em silêncio

apascento em silêncio cada uma das letras

apedrejo o alfabeto
e o aparo dos meus dedos
cachorro
trá-lo de regresso arrumado em palavras

o silêncio é a escuridão do som
o branco é a sombra da escrita






(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 11:54
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Domingo, 16 de Janeiro de 2005

...

Intuir
intuir é desatar os pulsos
e ensaboar o futuro
com sabão perfumado

é sublime rebeldia

lanternas de brasa
vozes e claridades de água pura
braçadas de mantras
sopros de salvação


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:37
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Filigrana e chão


preservo na memória a exuberância dos vocábulos
e o trajecto da conversa

atrás de ti
como a tua sombra
sempre desfocados aos meus olhos
estendiam-se preguiçosos rebentos de folhas verdes
que bocejavam a cada palavra nossa
mas que despontavam vivazes a cada bocejo

a prosa seguia enquanto uma após outra
sempre à tardinha
todas as folhas desciam do arvoredo
flutuavam até à terra para serem filigrana e chão

e só as letras do que dizíamos permaneciam inférteis (?)
no ar



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:36
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...

Filosofia das frases
a filosofia das frases é como a da água

aguaceiros que a gravidade sorve e a ventania liberta

também os caudais de palavras se abatem sobre os poços
rasos de uma chuva mordaz que escoa como saliva

e a voz sai às cachoeiras
em rotas soltas que a terra não agarra nem o ar conserva



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:30
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...

Crescem searas
Crescem searas de trigo nos teus dedos
que sulcam a terra como arados
feitos da ferrugem dos séculos

Chove

Cintilam torrões negros
musgo-húmus já ignoto no tempo e na história
como se fossem amalgama de sangue
e nós de uma corda feita de gente



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:28
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...

Avatares
Soavam ditirambos a Baco-Príapo
enquanto lhes vendia corpo e alma

Dos Demónios não tinha recordações futuras
porque o Verbo era apenas profecia

De Sidarta a memória muito distante
de uma sabedoria feita de avatares

E a vida toda ela presente
toda sentidos e corpo



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:25
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...

No ar
Quando os dedos correm as teclas
os passos ouvem-se martelados,
nítidos, como se o piano fosse uma planície de trigo,
cheia de gente em tempo de monda.

No ar fica o rasto de quem trabalha.
O perfume dos corpos suados ...


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:24
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...

Esquecimento
Quando crescemos deixamos cair no esquecimento
a maneira sempre ingénua de ver as coisas.

Quando crescemos lembramo-nos só vagamente
da lentidão de um tempo que teimava em correr devagar
e de uma meninice longínqua



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:24
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...

Sherazade
Sherazade pode contar histórias
pode construí-las em mil e uma noites
Que Rimsky as descreve com o rigor da música
e a precisão da sua batuta

Ali Baba pode ordenar aos sésamos que se abram
Simbad pode navegar nas águas turvas
ou nas areias revoltas de Bagdad

Que Sherazade descreve o seu mundo com mestrança
E Rimsky as histórias com muito brilho



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:23
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...

De nascente a poente
Sou relógio,
giro enquanto o tempo, de nascente a poente,
cruza o céu e este umbigo, de onde me nascem os ponteiros
e me surge a rotação.

Os ponteiros afligem-me, porque não sei se o movimento é deles,
se meu e de quem me traz consigo.

E quando me vejo neste azáfama incessante,
nestes encontros de olhares furtivos,
nesta medição despreocupada da intimidade dos outros,
cresce-me o apetite de ficar quieto,
como se fosse dono do que não sou

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:17
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...

Breve medida
o teu rosto faisca virtudes

nas manhãs mais humidas escorre da névoa
vago e manhoso como o orvalho trocista

o teu rosto é uma breve medida
uma cadencia rasa de falatórios e de rimas



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:10
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...

Da inocência
I

Da inocência falava o unicórnio à virgem
enquanto ela expunha os seios desnudos e firmes
para que neles encostasse a cabeça
e a donzela se apoderasse do chifre

II

É este o mistério do unicórnio
tão excessivo para quem se corrompe
que só pelas mãos puras de uma virgem se deixa mutilar

III

Nascido da observação atenta das nuvens
devorador dos eclipses e zelador das chuvas fecundas
o seu fascínio pela pureza é desmedido

IV

Pela inocência e pela candura tem tal apreço
que se fica pela sua contemplação

V

E assim preserva a brancura e deixa de lado tentações
que maculem o objecto do seu desejo


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:09
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...

É bom
de que serve estar só
se coabitam connosco tímidas convicções

tão frágeis
que há balança que as pese

é bom ver repleta de Irmãos
a praça onde nos encontramos



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:08
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...

Os astros
são vagabundos
adoradores da noite
e não erram o seu propósito

porque são o telhado do mundo
rompem do escuro

são naus carregadas de lastro
e pedra bruta em forma de nada

Divina condição de poder ser tudo


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:07
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...

Sono
não sei se durmo ou vivo

porque sinto o sono nas veias
e o sangue a hibernar-me no corpo



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:07
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...

Rebeldia
Saíram dos logradouros
da filosofia

Dos preceitos
da rebeldia

Mais forte do que as leis
a resistência telúrica
que já vem do berço
aos açoites

mesmo esmagadas nos calcários
as ossaturas e as espinhas
são estampas fósseis
da insurreição da vida


(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 14:06
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...

Hei-de lá pôr tudo
hei-de fazer uma azenha no meio do mar

uma azenha enorme
em que o peso das águas mova pedras circulares
redondas tamanho de continentes

no olho-da-mó hei-de lá pôr tudo



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 13:50
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...

no deserto
as promessas do paraíso

nas vagas de areia
a magia

nas dunas de silêncios
um cardume de sereias

no deserto
nada

só a tranquilidade e o encanto das fadas



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 12:32
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...

Já os eremitas do deserto procuravam nas dunas
o que de profundo pode haver na sua contemplação:
uma virtude tão próxima de Deus quanto afastada do diabo.
Catavam em cada grão de areia os pecados do mundo
e nada achavam,
porque olhos castos não podem saber o que é o vício,
nem procurar formas e conteúdos que não conhecem.
No deserto a solidão pode convidar à procura.
Pode, até, aproximar um homem de si mesmo,
mas nunca de Deus.

Diria o profeta que um homem mesquinho está longe das pessoas,
mas perto do inferno.



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 12:24
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Sexta-feira, 14 de Janeiro de 2005

Jornada


Quem me esboçou a jornada
deu-me também liberdade no risco

Livre será o arbítrio
Tanto como o destino que há-de perguntar-me
que desenho fiz da minha vida
que traçado lhe dei
qual foi o estado da arte dos meus últimos dias

Direi que não descobri o umbigo do mar
Que não converti
nem pesquei
todos nem parte dos peixes do sermão

O que me dói muito

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 13:44
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Segunda-feira, 10 de Janeiro de 2005

Cidade madrasta

1. no bulício da cidade não encontro
búzios nem conchas

2. bem longe as ondas libertam-se na falésia
suicidas rebentam numa revolta contida
turbulenta à superfície
muito serena junto ao chão

3 . quando se pertence ao mar
todas as cidades são madrastas




(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 00:02
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Quarta-feira, 5 de Janeiro de 2005

Sementes do fogo


As sementes do fogo, luzes do espírito
que Prometeu roubou,
poderia eu tê-las furtado no fervilhar deste alvoroço de pensamentos.
E que Zeus me punisse:
que soltasse feras, de rapina e doutras qualidades;
que me enredasse em correntes ou simples freios;
que atasse por inteiro a linhagem dos Titãs...

Que não é possível saber de mais!!!



(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 12:29
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Segunda-feira, 3 de Janeiro de 2005

Hoje não

não quero regressar
hoje fico ancorado na margem de cá

as esmolas que aqui recolho são tantas
que pagam viagens e ausências

não
hoje não quero acordar

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 11:38
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Sábado, 1 de Janeiro de 2005

os relógios calaram-se

os relógios calaram-se

na cidade acabou-se a história
quando o tempo ancorou

nem outros dias
nem outras noites
sempre o presente

as crianças pernoitaram na inocência
e os velhos na sabedoria

cada um como era
cada coisa como estava

os relógios de sol ficaram de vez à sombra
e só as clepsidras mediam a escuridão

(c)Todos os Direitos Reservados Luís Natal-Marques às 04:59
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