De calções e de sandálias,
ainda não sabia bem quem era
e já pedalava no meu triciclo
feito de ferro e madeira.
Pedalava,
Pedalava,
Pedalava.
E quando o senhor Pombinho
parava a burra, tocava a corneta
e chamava para que vissem as frutas
e as verduras que trazia,
eu dava ao pedal e ia pelo quintal.
Os pedais guinchavam
e a roda da frente, desconchavada,
dava e dançava ao sabor das pernas.
Em ziguezague,
em zaguezigue
No largo, frente ao portão,
estava a carroça carregada de frutas,
legumes e hortaliças muito viçosas.
No chão, o descanso caído porque a alimária,
de tão má, espumava de cansaço.
A burra travessa e destravada
mordia os mais incautos e atrevidos.
E o senhor Pombinho dizia:
- Cuidado que ela é falsa!
Só não ladra porque não é cadela!
Mas eu sabia que ela ladrava a zurrar
e zurrava a ladrar.
Quem se aproximava da carroça,
mesmo sem querer provava as doçuras
que o Pombinho trazia.
As melancias jaziam caladas*
com as entranhas à vista,
os figos desalinhados
e os cachos de uvas negras
ficavam ratados e sem planta nenhuma.
E o senhor Pombinho protestava.
Com o tempo o homem deixou de aparecer
e eu nunca percebi se tinha morrido ele,
a burra
ou a carroça.
Hoje imagino o Pombinho, qual pombinha, a dar às asas,
a carroça desengonçada a voar com ele
e a burra, qual Pégaso, a relinchar aos zurros
pelos céu azul.
E eu de calções e sandálias.
*Calar: Fazer abertura ou corte em certos frutos, geralmente para provar ou ver se estão maduros (ex.: calar a melancia).
. Frágil
. És louco
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